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Vestindo o manto do morcego

FILME: Batman – Cavaleiro das Trevas (The Dark Knight) EUA, 2008 – Aventura/Drama – 152 min. Matéria de Carlos Campos para o site “Claquete Virtual”, 2008.

Divulgação

Batman é uma criatura de várias facetas. Na Sétima Arte, o herói já ganhou encarnações diametralmente opostas, sendo interpretado por meia-dúzia de atores diferentes, em abordagens distintas a cada novo projeto envolvendo tal encapuzado. Mais recentemente, sua figura foi reiventada novamente, numa série cinematográfica cuja pretensão era livrá-lo das bobagens cometidas no passado distante e reapresentá-lo em um formato realista – algo condizente com seu histórico nos quadrinhos. Apelidado de “Begins”, o “início” da franquia – na verdade um reinício – conseguiu realizar este objetivo com êxito. “Em ‘Batman Begins’, nós nos concentramos nas origens do personagem: como ele evoluiu do próprio trauma inicial de Bruce Wayne, seus medos, sua raiva e, por fim, sua resolução de combater o crime e a corrupção”, explica a produtora Emma Thomas.

“Assim, embora Bruce precise usar uma fantasia para proteger sua identidade, na verdade é Batman quem define a verdadeira personalidade de Wayne, sendo sua imagem pública de Playboy a ‘máscara’ que ele usa para coexistir nesse mundo”, ela delimita. “Achei que deixamos o universo de Batman em um ponto interessante no primeiro longa, sugerindo uma direção intrigante pela qual a história poderia prosseguir”, continua Christopher Nolan, diretor destes dois recentes bat-longas. “Há algumas conseqüências muitas negativas de sua cruzada que estão prestes a ocorrer em Gotham”, reitera o cineasta, lembrado até hoje pelo fantástico “Amnésia” (2000). “Por um lado, Batman começou a livrar as vielas da brutal guerra de gangues que a assolava – mas, ironicamente, o vácuo que ele criou atraiu um elemento criminoso ainda mais poderoso, que vê isso como sua oportunidade para assumir o controle”, revela Charles Roven, igualmente produtor de “Cavaleiro das Trevas”. Um título muito popular entre os fãs e que diz bastante sobre a presente (sombria) filmografia batmaníaca.

“Creio que Bruce achou que seu trabalho seria por tempo limitado, que Batman serviria como uma inspiração para Gotham e que, por fim, ele poderia deixá-lo para trás. Contudo, ele está começando a compreender, cada vez mais, que isso é algo que não pode ser abandonado agora, ou que talvez ele nunca possa abandonar. Há inimigos recém-chegados dos quais a cidade precisa ser protegida”, prossegue Christian Bale, interprete do protagonista, referindo-se (sobretudo) ao obstáculo escolhido pelos realizadores na hora de complicar (de vez) a exaustiva vida-dupla do “homem morcego”. “Este Coringa é o arquivilão supremo do cinema”, deleita-se Nolan. “Ao seu próprio modo, ele é um ícone tanto quanto o Cavaleiro das Trevas”, especula o autor. “O Coringa é um dos maiores vilões na tradição dos quadrinhos: psicótico, enigmático, esperto, diabólico, charmoso e divertidíssimo de se observar. Sabíamos que seria necessário um ator extraordinário para interpretá-lo”, pondera Roven, sabiamente.

O escolhido (acertadamente) para encarnar o “palhaço do crime”, claro, foi Heath Ledger, falecido brutalmente – lamentavelmente – pouco tempo depois das gravações, vitima de uma (mal-explicada) overdose pelo uso excessivo de medicamentos antidepressivos. “Heath criou algo completamente original. É impressionante, é cativante e surpreenderá as pessoas”, profetiza Christopher, ciente da excelência deste exemplo póstumo do enorme talento de Ledger. “De cada nuance física a cada emissão vocal, é simplesmente um desempenho inesquecível”, elogia Charles, com toda razão. “Conversamos sobre como víamos esse ser psicopata/vilanesco e tínhamos exatamente o mesmo conceito, Heath parecia compreender instintivamente como tornar esta figura diferente de tudo o que tinham feito antes”, recorda o filmmaker, fazendo referência ao cômico Coringa interpretado por Jack Nicholson, na primeira versão para as telonas da batsérie – lançada em 1989. “Para manter o tom estabelecido em ‘Batman Begins’, decidimos que ele seria um sujeito bastante sério. Por isso, começamos com a noção dele ser a forma mais extrema de anarquista, uma força do caos, um criminoso sem propósito que não está à procura de nada – no sentido de que não há motivação material para suas ações”, esclarece Nolan. “Em certo sentido, o Coringa é uma resposta lógica para o Batman, que instigou esse tipo de comportamento extremo em Gotham”, finaliza.

“Enquanto alguns consideram Batman um herói, outros se perguntam se ele está causando mais mal do que bem”, Emma vocifera, tocando no lado negro indelével deste estreito limiar entre combater o crime e fazer justiça com as próprias mãos (sujas). “Batman ainda tem uma imensa reserva de raiva-dor e sabe que poderia facilmente ir longe demais, por isso não deve ultrapassar esse limite. Ele precisa ter certeza de que, ao perseguir um monstro, ele próprio não se tornará um”, concorda Bale. Assim sendo, Batman resolve sair da solitária (perigosa) cruzada para encontrar ajudas bem-vindas, que podem auxiliá-lo a se manter na linha. “Agora temos um trio formado por Batman, Harvey Dent e o comissário Gordon – representando, o sistema judiciário, a polícia e um justiceiro – numa aliança para reduzir a criminalidade”, inúmera o dono da cadeira de direção. “Harvey assumiu a responsabilidade de enfrentar o crime organizado e limpar as ruas. Ele é a novíssima esperança em Gotham, o ‘Cavaleiro Branco’, como é chamado”, intercede Aaron Eckhart, interprete do citado promotor.

“Acaba sendo uma dinâmica interessante, porque Harvey vê o ‘Cavaleiro das Trevas’ lutando contra os criminosos de um modo como o próprio gostaria de agir, mas não pode. Dent precisa permanecer dentro dos limites da lei. Ele precisa fazer publicamente o que o vigilante está fazendo veladamente”, suscita Nolan. “Há certa quantidade de oportunismo pessoal acontecendo também, porque se Harvey Dent for bem-sucedido, então, talvez Bruce possa deixar de ser Batman. Quem sabe haja um mundo em que ele possa retornar a uma vida normal”, diz Thomas, entretanto, como lembrariam os leitores das HQs, outro futuro (provável) pode acabar se abatendo sobre os dois ‘Cavaleiros’ listados. “O Coringa e o Duas Caras são os dois personagens mais fascinantes das revistas do Batman. Eles têm uma característica quase mítica, e eu desejava muito vê-los pelo prisma que criamos”, entrega o diretor.

Entretanto, a película não vive só de arquiinimigos, promovendo surpresas a cada elemento introduzido nesta bombástica continuação. “Em ‘Begins’, precisávamos mostrar coisas tipo o Batmóvel e o uniforme. Ao mesmo tempo, não exploramos completamente todos os bat-dispositivos”, cita Chris Nolan, faceiro, incluindo no seu pacotão de novidades uma armadura reformulada (“Agora eu posso virar a cabeça”, sorri Christian, feliz com a liberdade propiciada pelo upgrade no pesado design), outros truques do “Batcinto” e um novíssimo veículo, o aguardado Bat-Pod. Além de cenários nunca visitados anteriormente – vide Hong Kong e a fria (entretanto belíssima) cobertura do milionário Sr. Wayne. “Estávamos atrás de maneiras para expandir o escopo do longa-metragem”, reitera Nolan, que continua: “Ao continuarmos a saga de Batman, o desafio era tornar as coisas grandiosas e melhores, tanto por meio da trama quanto através da forma como a apresentamos”, pondera, alicerçando os motivos que o levaram a filmar boa parte da obra com câmeras IMAX – feito inédito na área – conseguindo lindas imagens, extremamente amplas, muito acima das obtidas nas filmagens tradicionais. “Ela lança o público bem no meio da ação, de uma maneira que nenhum outro formato de cinema poderia”, defende-se o tutor-cineasta destas “mudanças técnicas” (pra melhor).

“Acho que Chris tem um grande talento para satisfazer as necessidades do entretenimento puro, sem prescindir dos momentos de grande conflito pessoal ou mesmo da dualidade dos personagens. No fim, ele consegue fazer as duas coisas sem comprometer nenhuma delas”, completa Bale, o titular do capuz negro. “Para mim, Batman tem um forte apelo e sempre foi capaz de fascinar platéias porque é um ícone com o qual as pessoas se identificam. É um mito muito comovente”, encerra Christopher Nolan, com a certeza de quem fora cumpridor de seu dever, mantendo o batsinal aceso. Da melhor maneira possível. Em todos os sentidos.

Fonte: Warner Bros.

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